A Av. Paulista já é conhecida como o principal espaço democrático da cidade. É aonde acontece as manifestações, os grandes shows, aonde muitas pessoas se encontram, inclusive é passeio oficial da família no final do ano, que aparecem para conferir a decoração de Natal.
Me lembro do meu encantamento quando pela primeira vez caminhei tarde da noite por lá e vi que ao contrário (infelizmente), das ruas da região central aonde eu trabalhava na época, lá havia vida, pessoas caminhando com os seus cachorrinhos, andando de skate, de patins, ou bebendo uma cerveja naqueles barzinhos próximo ao MASP que colocam as mesas na calçada. Pela primeira vez começava a olhar a Paulista não como um centro financeiro, mas como um lugar para pessoas.
Daí que no Dia Mundial Sem Carro de 2013, o SampaPé! se juntou a diversos movimentos (Matilha Cultural, +Voz, Tsunami, Virada da Mobilidade) para criar o evento que provocasse um novo imaginário da cidade, o Se a Paulista Fosse Minha, com a proposta de resignificar a Paulista, promover o uso da rua pelas pessoas.
Veja bem, não estavam falando de uma intervenção como tantas que sempre acontecem por lá, mas de transformar a Av. Paulista numa linda rua de lazer, um incrível parque ao céu aberto, um espaço para pessoas., uma proposta que no caso da Paulista, já existe pelo menos desde 2004.
E não é só no cartão postal paulistano que tem surgido propostas de “ruas para pessoas”. Em 2012, depois de arrecadar fundos através de um financiamento colaborativo, rolou na região do Campos Elíseos e Santa Cecilia o Festival Baixo Centro. O objetivo era ir além de uma intervenção artística e cultural, mas de pensar novos modelos de direito a cidade.
Quem não acompanha o debate, que como mencionei acima acontece já há algum tempo, vai achar que tudo isso é novidade, ou como dizem os mais críticos, “delírios autoritários de uma gestão que demoniza carros”. Mas na verdade não é nada disso, a ideia não é proibir a circulação dos carros, mas democratizar as vias (essa é uma avaliação longa, para qual sugiro esse post do Viatrolebús).
A proposta da Paulista Aberta (que é de iniciativa da sociedade civil – conheça na integra), nem pede o fechamento completo da Av. Paulista, mas sim de restringir o fluxo de carros em um sentido da avenida aos domingos, entre 7 às 16 horas, para uso das pessoas, assim como acontece há muitos anos no Rio de Janeiro, em que um dos sentidos da Av. Atlântica é fechada para lazer aos domingos.
Mas afinal porque liberar as ruas para lazer? Já não existe os parques?
São Paulo possui apenas 2,88m² de parques e praças por habitante – em Nova York, por exemplo, são 13m² por pessoa. A OMS – Organização Mundial da Saúde, considera saudável um mínimo de 12 m2 / habitante em áreas urbanas. Ou seja, ainda nos falta muito, mas muito espaços de lazer para atender minimamente a demanda da nossa megalópole.
Mas está certo restringir o direito de locomoção das pessoas, e os comércios, e os hospitais?
Como disse, a proposta é de fechar somente 1 das vias, mas mesmo durante o fechamento total da avenida que aconteceu durante a inauguração da ciclovia, a CET afirmou que não houve impacto para o trânsito local. Vale lembrar que travessas importantes como a Av. Brig. Luiz Antonio continuaram liberadas para o trânsito dos carros, e mesmo quem estivesse com destino somente a região da Paulista, além da opção de estacionar nas proximidades (do mesmo jeito que acontece nos dias de grandes eventos), a região é muito bem atendida pelo Metrô.
Mas e os hospitais?
A reportagem da Carta Capital tentou entrar em contato com os 15 hospitais que ficam a até 500 metros da avenida. Apenas o Hospital 9 de Julho, o Instituto do Coração e o Hospital Oswaldo Cruz não responderam à reportagem; os outros 12 afirmaram não se opor à medida (leia a reportagem na integra).
Enfim, claro que o debate em torno da democratização das ruas seja para os ônibus, as bicicletas ou mesmo para o lazer, ainda será longo, e há muitas, mas muitas questões a serem avaliadas. Mas acredito que o principal desafio é como conciliar as mudanças que a cidade precisa, com a dificuldade do ser humano em lidar com qualquer tipo de mudança, especialmente aquelas que mudam a nossa rotina.
Não há respostas ou modelos prontos, e não, não somos a Europa, e nem acho que devemos querer ser, pois só a cidade de São Paulo já é maior que muito país do velho continente, imagine então quando falamos que qualquer projeto de mobilidade urbana ou de ocupação de espaços públicos, precisa conciliar os interesses de uma grande região metropolitana como a nossa com 26 milhões de habitantes?
O desafio é imenso, mas precisamos no minimo estar abertos ao diálogo e as mudanças. Pois só o que está morto, não muda!*
* (trecho de Mude, Edson Marques)
Nota: Texto publicado originalmente no blog Inspiração Sustentável e reflete exclusivamente a opinião da autora, não necessariamente de todos os membros do coletivo Mobilidade Sampa.
Em 2015, o paulistano está mais na rua. E em praças, escadarias, jardins. Ao ar livre, ele faz sarau de poesia, shows, apresenta peças de teatro, come, cozinha, canta e dança. Ocupado, o espaço público da cidade, esvaziado nas últimas décadas, torna-se atraente de novo —tanto para os empresários de olho nos consumidores quanto para o cidadão que quer um parquinho legal para o filho brincar e conhecer outras crianças.
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