O acúmulo de atrasos na entrega de novas linhas e estações e a consequente superlotação do sistema de trens e metrôs de São Paulo fazem do uso do transporte sobre trilhos um vale-tudo.
Em dez anos, enquanto a extensão da rede do metrô cresceu 36%, o número de usuários subiu 92%.
Participe dos canais do Mobilidade Sampa: X (antigo Twitter), Facebook, Instagram, Threads, Bluesky, YouTube, LinkedIn ou canais no WhatsApp e Telegram
Para enfrentar plataformas, vagões e conexões apinhadas de gente nos horários de pico, os usuários criaram uma série de estratégias – muitas vezes, no mínimo questionáveis – para as viagens ficarem menos longas e espremidas.
Vale até apostar corrida antes da abertura das portas para não ficar preso na multidão, como faz todos os dias o estudante Higor Ferraz, 18.
“Uso a linha 4-amarela e, quando o trem está chegando na estação da Luz, eu já vou para a porta do vagão. Se você não corre, fica um monte de gente na escada e me dá agonia. Gosto de chegar primeiro para pegar um bom lugar na CPTM“, diz.
BLOGUEIROS
Vale calcular qual vagão para exatamente em frente à escada de saída ou de conexão que se quer fazer.
A tática, de tão corriqueira, ganhou até uma lista, compartilhada em blogs e redes sociais, que promete mapear portas e vagões certos para ganhar tempo.
Na estação da Sé, por exemplo, a mais movimentada de todas as do metrô, quem chega pela linha 3-vermelha, sentido Barra Funda, e quer ir para o sentido Tucuruvi da 1-azul procura ficar na última porta do penúltimo carro ou na primeira porta do último carro.
“Aprendi com o tempo. Se não fico no vagão certo, perco mais de dez minutos”, conta Gabriel Ferreira, 21.
Há também quem se arrisque a fazer uma manobra proibida e muito perigosa: saltar da plataforma para o trem, ainda em movimento, grudando na porta para ser o primeiro a entrar.
“Tem que dar uma de Homem-Aranha pra conseguir sentar. Não deveria ser assim, mas cada um dá seu jeito. Ficar de pé por 40 minutos depois do serviço é dureza”, diz Leonardo Oliveira, 31. Ele é um dos passageiros que adotam a prática na estação Brás da linha 12-safira da CPTM.
O objetivo é garantir um lugar sentado.
LÓGICA
No vale-tudo, vale ainda o que parece pouco lógico: pegar o metrô no sentido contrário ao de casa.
A chamada viagem negativa é usada por passageiros que preferem perder tempo em um trajeto extra até mais uma estação para obter um assento vago na composição vazia e viajar sentado.
É o caso das atendentes Alexandra Lúcia Silva, 37, e Andréa de Queirós, 33, que trabalham de pé o dia inteiro numa lanchonete e preferem fazer uma viagem ao terminal Barra Funda para encarar o trajeto de volta até Artur Alvim sentadas.
“Não ligamos para o tempo, não. Queremos é ir sentadas”, diz Alexandra. “De pé é um empurra-empurra danado. Uma cotovelada aqui, um pisão no pé ali. O trecho é longo, isso quando não dá pane. Sentada, fica suave”, completa Andrea.
Há ainda quem burle o fluxo de entradas e saídas indicado nas placas e utilize as plataformas centrais nas conexões, entrando no vagão pela porta por onde todo mundo sai. “Faz tanto tempo que faço que isso que já é automático. No horário de pico, só consigo embarcar desse lado”, conta a estudante Chimene Araújo, 30, que adota a prática na Barra Funda.
Em nota, a Secretaria Estadual dos Transportes Metropolitanos diz que a rede tem normas de uso para garantir a segurança dos passageiros e que eles “devem atentar-se às regras de boa convivência para deslocarem-se com segurança dentro e fora dos trens”.
Fonte: Folha de São Paulo