Na Avenida Paulista, um tapete vermelho. Na avenida Bento Guelfi, no extremo leste de São Paulo, lama. A comparação simboliza tratamentos diferentes da gestão Fernando Haddad (PT) às ciclovias na capital paulista.
Nos principais bairros centrais e de classe média, há resistência de moradores e comerciantes, mas as pistas para bicicletas contam, em geral, com asfalto e sinalização em condições razoáveis.
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Já nos extremos da cidade a manutenção foi deixada de lado -e as ciclovias estão tomadas por sujeira, buracos, enchente, falta de sinalização, iluminação e fiscalização. Além da conservação mais precária, as pistas para bikes nesses bairros paulistanos são também mais escassas.
Das 32 subprefeituras da capital, só 6 não ganharam ainda ciclovias sob a gestão Haddad, todas na periferia: Sapopemba, Itaim Paulista e Guaianases, na zona leste, M’Boi Mirim, Cidade Ademar e Parelheiros, na zona sul.
Desses locais, Sapopemba, Itaim Paulista e Cidade Ademar têm mais de duas mil viagens de bicicleta por dia, segundo pesquisa do Metrô. Entre 96 distritos, eles fazem parte dos 20 com mais ciclistas.
APAGADA
O último balanço detalhado divulgado pela prefeitura, em junho, apontava 238 km de ciclovias implantadas desde 2014 –a meta é 400 km. Segundo a gestão Haddad, houve mais 11 km desde então.
As subprefeituras que mais receberam vias para bikes foram Butantã (40,2 km), Sé (33,9 km) e Lapa (19,7 km).
Na avenida Bento Guelfi, no bairro do Iguatemi (zona leste), além de apagada, a ciclovia é invadida por barro.
“Olha que fizeram este ano e já ficou desse jeito”, diz José Batista, 60, borracheiro. Ele reclama que a ciclovia sai do centro da via e muda em direção ao canteiro central justo em frente ao seu estabelecimento, onde ele costumava trocar os pneus dos carros.
Pouco depois, sem sinalização, a ciclovia volta ao centro da avenida, obrigando os ciclistas a ziguezaguear.
Em outro lado da cidade, no Campo Limpo (zona sul), Jovaildo Oliveira, 51, que pedala e trabalha consertando bicicletas, reclama do estado de conservação da ciclovia na rua Guilherme Mainardi.
“Vê se dá pra andar aí”, diz Jovaildo Oliveira, 51, apontando para os buracos. “Para a gente, seria bom uma ciclovia na estrada do Campo Limpo, onde os ônibus passam tirando fina de quem pedala.”
A crítica é parecida em outras áreas, com ciclovias que seguem pelo miolo dos bairros e acabam antes dos grandes corredores viários.
Alguns ciclistas são obrigados a pedalar fora das ciclovias devido aos obstáculos. Também no Campo Limpo, na rua Caio Graco da Silva, em trecho sem calçada, são os pedestres e vendedores de frutas com seus carrinhos que tomaram a faixa das bicicletas. Em vários trechos é possível ver carros estacionados, problema que se repete no Parque São Rafael (zona leste).
Na Vila Prudente, há problemas de drenagem e no asfaltamento. Na rua Professor Gustavo Pires de Andrade, a tinta foi passada sobre um trecho de paralelepípedos, causando desnível na pista.
Em Sapopemba, a falta de ciclovias é motivo de queixa. “Fui atropelado por um carro que entrava num posto. Nos trechos com ciclovia, não corro esse risco”, disse Everton Barbosa, 21, metalúrgico que sofreu ferimentos leves e pedala até a Vila Prudente diariamente para economizar.
OUTRO LADO
O diretor de planejamento da CET (Companhia de Engenharia de Tráfego), Tadeu Leite, afirma que as ciclovias chegam em alguns bairros periféricos antes de outras melhorias de infraestrutura.
De acordo com ele, na periferia há um deficit histórico de reformas, como em calçadas, que necessitam de soluções mais complexas. Daí surgem alguns dos problemas encontrados pela reportagem, afirma ele.
Sobre as ruas esburacadas e com problemas de drenagem, a companhia afirma que faz os reparos na hora da implantação quando há risco para os ciclistas. Quando o caso é menos grave, as subprefeituras são notificadas.
No caso específico da avenida Bento Guelfi, a Subprefeitura de São Mateus diz que intensificará a limpeza. A manutenção acontece duas vezes por semana e será intensificada devido às chuvas.
Na ciclovia do Parque São Rafael, parte das vias já recebeu lâmpadas novas. Especificamente na rua Martim Soares Moreno, será avaliada a necessidade de instalação de novos pontos de iluminação.
Tadeu Leite, da CET, afirma que a pesquisa de origem e destino dos bairros não é o única base de decisão sobre onde vão ser implantadas as ciclovias. Entre outros critérios, são levados em consideração a ligação a pontos de interesse da população e os pedidos da população.
Ainda há cerca de 150 km de novas vias que beneficiarão alguns bairros que não receberam ciclovias até o final da gestão Fernando Haddad, diz a companhia.
A CET afirma também estar trabalhando com fabricante de tintas para desenvolver um material mais resistente.
De acordo com a prefeitura, aumentaram as multas por desrespeito às ciclovias. As de estacionamento sobre a ciclovia subiram de 197, de janeiro a maio de 2014, para 784, no mesmo período deste ano. Já as multas por trafegar sobre a ciclofaixa passaram de 109 para 773.
Fonte: Folha de São Paulo